terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Subsistência

Nos dias em que estou sozinha em casa a cozinhar, vou deixando os pensamentos fluir. Enquanto corto legumes, mexo, provo, adiciono, retifico, a minha mente vai correndo a alta velocidade. Vou pensando no dia-a-dia e no que tenho de fazer. E vou sonhando. 
Numa destas divagações, comecei a imaginar-me a viver com carências de alimentos. Pensei nos hábitos que teriam que ser alterados se muitos produtos a que estamos habituados deixassem de vir para a ilha. 
Infelizmente, somos muito dependentes. Nas últimas décadas, pouco ou nada produzimos. Quase tudo vem de fora. Fruta da América do Sul, peixe do Vietname, bacalhau da Noruega. Apesar de serem as vacas a nossa imagem de marca, é mais fácil encontrar carne importada do que produzida cá. Apenas os laticínios açorianos continuam a liderar o mercado.
Nos últimos tempos, tenho consumido muitos produtos da nossa horta e outros da horta do meu pai. E são sempre os que me sabem melhor. Quando saio à rua para ir colher couves, ou malaguetas, ou salsa, ou qualquer outra erva aromática, sou invadida por uma mistura de sentimentos que passam pelo orgulho e  pela sensação de dever cumprido, de realização pessoal. Sinto-me independente, de certa forma. Sinto que era capaz de não passar fome, mesmo que, por alguma razão, deixássemos de importar alimentos. Eu sei que esta é uma ideia utópica, que ninguém se alimenta só de couves e de outras ervas do jardim, mas já é um começo. 
Este jantar foi feito com muitos ingredientes caseiros: couves, cebola de rama, tomates (congelados desde o verão), batatas e alhos. E soube-me duplamente bem. E restou para, no dia seguinte, levar para o almoço. Afinal, há formas de poupar que não implicam sacrifícios :)

Canelones de couve com béchamel de cominhos




Ingredientes:

400 g de carne de vaca moída
400 g de carne de porco moída
4 cebolas de rama (ou uma cebola grande)
4 dentes de alho
1 ramo de coentros
Azeite (cerca de 1/2dl)
2 tomates (usei congelados)
4 colheres de polpa de tomate
Cerca de 1/2 dl de vinho branco
Sal e pimenta
8 folhas de couve
Queijo da ilha q.b.

Ingredientes para o béchamel:
600 g de leite
60 g de farinha
40 g de manteiga
Sal e pimenta
1 colher de café de cominhos (facultativo, mas resultou muito bem)

Escaldei as couves e reservei. Fiz um refogado com os alhos, as cebolas, os coentros e o azeite. Adicionei o tomate, cortado em pedaços, a polpa de tomate e a carne. Deixei cozinhar até a carne ficar com um tom acastanhado. Juntei o vinho branco, retifiquei os temperos e deixei cozinhar mais alguns minutos. Entretanto, preparei o béchamel, na Bimby: coloquei todos os ingredientes, programei 8 minutos, 90 graus, velocidade 4. Recheei as couves com a carne, dando-lhes a forma de canelones e dispu-los numa assadeira. Cobri com o béchamel, polvilhei com queijo da ilha ralado e levei ao forno a gratinar.
Acompanhei com batatas fritas às rodelas, na Actifry.


11 comentários:

  1. Ilídia nada melhor que colher os alimentos da nossa horta, tem outro sabor :)
    Gostei destes canelones.

    Beijinho

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  2. Compreendo o teu sentido de dever cumprido pois acontece me o mesmo quando vou comprar legumes a uma srª que os cultiva. Não tenho espaço para uma horta mas ajudo quem o faz para sobreviver e apesar de algumas vezes me abastecer no supermercado, quando compro as verduras a essa srª o sabor é diferente e bem mais presente do que as outras. Não sei se é do "amor" que se põe ao cultivar ou se será da terra, o que é certo é que se pudesse teria uma mini hortinha para me dedicar....

    Estes cannelonis ficaram fantásticos!!

    Bjoka
    Rita

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  3. Eu adoro tudo o que tenha a ver com poupar, deste fazer as bases de tartes ou pizzas, de aproveitar tudo e de utilizar tudo o que nos dão. Acho magnifico! E esses canelones ficaram com um aspecto muito apetitoso. *

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  4. O aspecto da tua refeição é fantástico.
    E o que importa é sentires-te bem com o que comes e cozinhas.

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  5. Subsistência é uma daquelas palavras que me faz lembrar a escola primária. Porque estudávamos que a maior parte da agricultura praticada no nosso país era assim. De subsistência.
    Sempre gostei dessa ideia. A de nos permitirmos um exercício circunscrito de autonomia. Principalmente agora, em que os nossos consumos vêm de sítios longe. Somos tão pouco independentes, no fundo. Se há um conflito qualquer no Médio Oriente, tememos pelo nosso modo de vida. Tão na dependência das reservas de petróleo. Se em Espanha há uma greve de camionistas, sabemos logo que há-de haver consequências bem tangíveis. Por isso, o teu texto e a receita são uma das formas possíveis de evocação da nossa vontade (também ela a possível) de subsistência.
    Não bastando, as fotografias são belíssimas. Muito especialmente a que faz adivinhar a frescura toda dos vegetais cultivados por ti.

    Um beijo.

    Mar

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  6. Olá Ilídia:)
    Como eu gostava de ter assim uma horta para cultivar também os meus legumes! Deve ser delicioso ir observando o seu desabrochar e desenvolvimento até ficarem prontinhos a serem saboreados:)
    Os teus canelones estão com um aspecto incrivelmente tentador e gostei muito do toque diferente que deste ao béchamel.
    Um beijinho:)

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  7. Os alimentos acabados de colher são uma verdadeira maravilha. O cheiro, o sabor...não tem comparação com os que se compram. Neste momento já me estava a imaginar com uma hortinha! Quem sabe um dia!

    O teu prato está maravilhoso.

    Beijinhos

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  8. Uns canelones que exibem todo o orgulho de uma couve plantada por nós. O primeiro exercício devia ser esse: brio e orgulho no que se faz tirar da terra. É que a agricultura, infelizmente, continua a ser vista com muito desdém por muitos dos Dâmasos do post lá de baixo...
    Babette

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  9. Hum...que maravilha..adorei a ideia, as fotos e a receitinha. Parabéns por tudo.

    Beijinhos

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  10. É deveras um consolo ter uma horta em casa. A minha, ainda experimental, continua a produzir couves que têm servido para colorir as sopinhas cá de casa.Ainda estamos nos arranjos exteriores, mas vamos conseguir dinamizar melhor a nossa horta.É preciso é ter tempo. Ontem os miúdos calçaram as botas de cano e fomos pela mata dentro, com os cães atrás, apanhar jarros. Lembrei-me de ti. Regressámos cansados mas felicíssimos. Tirar partido da natureza e do que ela nos dá é muito importante. E a satisfação que te deu confecionar e apreciar estes canelones é prova disso.
    beijinhos
    Patrícia

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  11. É das coisas que mais pena tenho é de não ter um bocadinho pequenino de terra onde pudesse cultivar as minhas ervas, e legumes, e ter um limoeiro. Pronto, contei, adorava ter um limoeiro, mas não me perguntes porquê.
    Uns canelones assim com produtos da horta t~em outro sabor de certeza.
    Um beijinho e bom fim de semana

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