quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Rentrée

Nós, portugueses, somos exímios a importar palavras. Do inglês, do francês. Para nós, todas as línguas são mais chiques do que a nossa humilde língua lusa. E os estrangeirismos que mais se ouvem/ leem por estes dias são “silly season” e “rentrée”.
Estamos a sair da silly season, em que supostamente andámos todos tolinhos, a ler coisinhas leves, que não puxem muito pelos neurónios, e entramos na reentrée (desculpem-me o pleonasmo). Já começaram as campanhas de regresso às aulas, com crianças e pais muito bonitos e muito felizes. Criancinhas cheias de saudades dos professores e das aulas e paizinhos satisfeitos por desembolsar centenas de euros em livros e material escolar. As televisões apresentam os seus programas novos, e matam a curiosidade dos telespectadores, anunciando, finalmente, quem os vai apresentar, com o brilhantismo a que já estão habituados. Os jornais anunciam a rentrée dos partidos políticos. Divulgam-se os filmes, os espetáculos e os discos agendados para a rentrée, as revistas sentenciam o que continuará in e o que passará a estar out na próxima temporada, isto é, a roupa e os sapatos que devem ser postos fora e os que convém guardar. Claro que na página seguinte pode aparecer um artigo de opinião sobre o sobreendividamento dos portugueses. Sobre a importância de poupar. Ora, uma pessoa que acabou de sair da silly season fica confusa. Temos que começar a pensar devagarinho. O cérebro, desabituado, pode entrar em choque. Convém um tempinho de aquecimento. Afinal em que é que ficamos? Poupamos ou andamos na moda? É difícil ser português. Mais difícil ainda é ser portuguesa. Mas difícil, difícil é ser portuguesa e gostar de roupa. E de sapatos. E de livros. E de objetos de decoração. E de kitchen gadgets.
Estou bored. Não sei se vá cozinhar ou se vá às compras. Parece-me melhor ir para a cozinha. E depois vou dar uma volta ao roupeiro ver o que tenho que ainda está in.




13 comentários:

  1. Não podia estar mais de acordo contigo. O que fazer?! Temos mesmo é de começar devagarinho porque os neurórios estão lentos demais para grandes pressões!:)
    Aconcelho-te a ires para a cozinha pelo menos dá para te relaxar!lol

    Beijinhos

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  2. Olá

    Acho que está um belo texto pois colocaste por palavras o que vai na cabeça de muitos de nós.
    Tal como a Susana penso que será a cozinha a melhor opção. Dá para relaxar!

    Beijinhos

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  3. Ilídia este texto merece uma grande ovação. PARABÉNS. Adorei e reflecte pensamentos que também partilho. Tentamos nos adaptar aos estrangeirismos, não queremos ser menos "in" que os outros, e, apesar de usar alguns, mas poucos, penso sempre em Eça quando o faço. Esta é uma das razões pela qual invejo o povo americano, tem orgulho nele mesmo de uma forma que não encontro em outro lado. Não que não tenha orgulho de ser portuguesa, já tive mais, mas esta mania de vivermos numa sociedade de "chicos espertos" condiciona, a meu ver, comportamentos e linguagem. E, muito mais haveria para dizer mas tenho o chá à espera, e, a cozinha é sem dúvida um bom local para relaxar:) Beijinho

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  4. Gostei da Ilídia versão cáustica:) Mais ácida. Estou em muito do que disse. E no tom em que o disse. A minha sensação é a de assistir a uma coisa meio esquizofrénica. Todos os dias apelos que oscilam entre coisas que são muito diferentes. Criar distância. Percepcionarmos a realidade. Retirarmos dela o que nos fizer bem. Que pode ser uma receita. Ou um utensílio. Ou uma peça de roupa que acrescente beleza. O resto pode ficar. O que não interessa. Chamo de ruído ao que na realidade é de rejeitar. Que se faça barulho à vontade, que nós temos os nossos recursos interiores para nos mantermos a olhar as coisas como elas são. E de frente, que é assim que se percebe o que vai acontecendo. O seu texto fez-me pensar nisso. Em olhar de frente para as coisas.

    Um beijo.

    Mar

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  5. Simplesmente adorei a tua divagação.
    E afinal, foste às compras ou foste fazer uma bela comidinha?
    Beijinhos

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  6. Ilídia... vim cá visitar e descobri que é da Praia da Vitória... eu estive aí no início de Agosto... e adorei... quero voltar... tão simpáticas as pessoas que aí conheci... fiquei apaixonada pela vossa praia... pelas "socas" (não deve ser assim que se escreve...) com manteiga e sal... dos pequenos-almoços na pastelaria americana... que pena não a ter visitado antes...

    Adorei o seu blog e vou voltar...

    Um beijo

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  7. Aplaudo e subscrevo!...
    Fiquei com um "smile" ao lê-lo.
    Beijo
    Babette

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  8. Susana e Ana, têm razão. A cozinha é um ótimo ligar para relaxar e sai bem mais barato do que ir às compras.

    Fraldinha, perante essa ovação, só me resta fazer uma vénia :)
    Somos, realmente, um povo com uma auto-estima muito fraquinha.

    Mar, gostei da metáfora do ruído. Faz sentido. Tem razão, há que saber filtrar o que nos aparece pela frente. E tentar não ficar surdo :)

    Ivone, eu sei que gostas das minhas divagações ;) Fui para a cozinha. Tenho que pôr um travão ao meu consumismo desenfreado. Afinal, estamos em crise :(

    Sophy, bem vinda. Fico contente por ter gostado da minha terra. Também adoro socas (as de comer; as de calçar nem por isso, acho-as deselegantes :)
    Em agosto eu estava fora, de férias. Mas avise-me da próxima vez que vier, sim?
    Estou a adorar estas teias virtuais.

    Babette, obrigada. Fico contente por a ter feito sorrir.

    Beijos para todas

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  9. Queria ter escrito este texto! Brilhante!
    Um beijo

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  10. Belo texto, gostei, mesmo muito, do "nosso" movimento pendular aqui retratado!!
    Qto a Lobo Antunes (o teu comentário no meu blog) confesso que também o adoro ouvir, a envolvência profunda fascina-me.
    E...bom regresso às aulas (com aquela certeza, imprescindível, que vais espicaçar os alunos)!
    Beijinho

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  11. Mané, obrigada. E sim, vou tentar "espicaçar" os alunos. Beijos

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  12. Ilídia,
    Não podia concordar mais com o que escreveste... Embora eu também cometer os mesmos erros. Mas não porque eu quero ( as vezes já esqueço-me de certas palavras em Português) Então la vem os pontapés na gramática. Mas concordo plenamente.
    Obrigada pelo lindo texto.

    Beijinhos

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