domingo, 16 de outubro de 2016

Ponta Delgada. Uma mercearia bonita. E uma receita francesa.

Visitar esta cidade sabe a regresso a casa. Foram muitos anos. São muitas as memórias. Foi lá que aprendi a crescer/ também a sentir saudade, como dizia a música dos Tunídeos. Ainda no avião, vejo os contornos conhecidos. As Portas da Cidade, o verde água do hospital velho, a silhueta do Edifício Solmar. Sinto-me acolhida por um abraço caloroso que me dá as boas-vindas. Como quando chegava da escola no inverno, em dias de chuva, e a minha mãe me recebia com uma manta e um copo de leite morno.
Ultimamente, as visitas têm sido breves. Quase sempre escalas entre viagens mais longas. Desta vez, uma reunião na segunda-feira fez-me voar até Ponta Delgada no domingo à tarde. À minha espera, os amigos de sempre. Encontro outros, que fui fazendo ao longo dos anos. Já se conhecem todos, de outros momentos como este. São os meus amigos micaelenses, ainda que sejam continentais ou faialenses.



A casa da Helena e do Pedro é familiar. Cheia de memórias com quase vinte anos, de almoços e jantares apressados, no nosso ano de estágio. A casa que era dos pais da Helena agora é dela e do Pedro. Jantamos, os três. E combinamos férias que hão de vir. E bebemos tinto, sempre muito bem escolhido pelo Pedro. A Mia salta-me para o colo, com a familiaridade ronronante de quem me reconheceu. No fim, passeamos o Dunga, que reclama, impaciente, no jardim. Subimos a rua. Continuamos por outras, bem familiares. E rimos muito, os três. Por momentos, voltamos a ter vinte anos e passeamos pela Mãe de Deus, em frente à nossa Universidade. 



Regressar a Ponta Delgada é recordar momentos e lugares. E descobrir outros, de uma cidade que se reinventa a cada dia. Antes de regressar a casa, lanchámos num lugar lindo, com o ar de outros tempos de que tanto gosto. Louvre Michaelense. O nome recorda a tendência de dar aos nossos lugares nomes importados de França. Este Louvre não é um museu, nem nunca o foi. No princípio do século XX, era uma loja de tecidos e chapéus importados de Paris, que também funcionou como galeria de arte. Agora, é uma mercearia onde se pode encontrar chás Gorreana, mel e licores açorianos, louças kitsch e muitos outros produtos artesanais. O edifício é lindo e foi alvo de uma recuperação que respeitou o espírito do passado, com aquele ambiente escuro de madeiras e mosaicos típico de há cem anos. No balcão, há rebuçados a granel, como os que comprávamos nas vendas, à saída da escola. Enquanto apreciamos tudo isto, podemos deliciar-nos com um bolo ou uma das bolachas expostas no balcão comprido e provar um chá com aromas mais ou menos exóticos. Tudo servido à l'ancienne, em tabuleiros forrados com naperons e pratos estampados, que há anos seriam considerados fora de moda. Há algum tempo que a veia de blogger não me invadia quando andava por fora. Mas foi impossível não me deixar levar por este ambiente e pelos pormenores desta loja à antiga.











A receita de hoje é um clássico da culinária francesa: sole moulière, um dos meus pratos de peixe preferidos. De uma delicadeza e simplicidade que provam que a culinária deste país não é um bicho de sete cabeças. 

                                        Linguado à moleira
                                           (Sole meunière)


Ingredientes para uma pessoa:
1 linguado pequeno, arranjado (o meu veio do sítio do costume)
1/4 chávena de farinha de trigo
sal e pimenta a gosto
2 colheres de sopa de manteiga
1 colher de sopa de alcaparras (opcional)
salsa picada
3 rodelas de limão

Preparação:
Começar por arranjar o linguado, caso não o tenham feito na peixaria: com uma faca afiada, fazer uma pequena incisão junto à barbatana caudal e puxar a pele em direção à cabeça (parece uma tarefa complicada, mas verão que não é; a pele sai com facilidade). Com uma tesoura, cortar as barbatanas laterais e a cabeça do peixe.
Temperar a farinha com sal e pimenta e passar o peixe pela mistura, sacudindo bem o excesso. 
Levar ao lume 1 colher de manteiga. Quando aquecer, fritar o linguado, 3 minutos de cada lado. Retirá-lo para um prato aquecido, limpar a frigideira com papel de cozinha e preparar o molho: levar ao lume uma colher de manteiga. Quando derreter, colocar as rodelas de limão e deixar a manteiga escurecer um pouco (os franceses chamam a esta manteiga beurre noisette, por causa da cor, semelhante à da avelã). Quem desejar, pode juntar alcaparras, apesar de a receita original não levar este ingrediente (eu gosto muito do toque salgado que acrescentam). 
Verter o molho sobre o linguado e servir, polvilhado com salsa e acompanhado com batatas e legumes cozidos.



Bon appétit!





8 comentários:

  1. Uma receita mesmo a meu gosto Ilídia além disso adoro os teus apontamentos e fotos que nos levam a viajar contigo...

    Beijinho e um bom resto de domingo!

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    1. Um clássico simples e sempre apreciado. Fico feliz por gostares, Mariana :) Muito obrigada!

      Um beijinho. E uma boa semana.

      Ilídia

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  2. estive no Louvre Michaelense quando fui aos Açores o ano passado ... adorei, cada canto, cada bolinho, cada chávena de chá ... trouxe tanta coisa para casa :) local lindo <3

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    1. Impossível não nos rendermos, não é? Eu fui a uma reunião, só com bagagem de cabine. Tive de me controlar ;)

      Um beijo,

      Ilídia

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  3. Ilídia,
    que saudades de S. Miguel. Fui lá já há 10 anos, nem quero crer que passou tanto tempo. Era para ter regressado esta Primavera, mas com o trabalho foi impossível. Esse cantinho é lindo.
    E eu adoro linguado, parece-me delicioso.
    Um beijinho.

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    1. São Miguel é uma ilha linda, a minha segunda casa. E este lugar é delicioso. Impossível não nos derretermos com todos os detalhes, tão bem pensados.

      Um beijo para ti,

      Ilídia

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  4. Quando formos aos Açores, havemos de ir também a este sítio. Vi há uns dias uma reportagem e achei de encantar. Mas sabes, aquilo com que sonho mesmo é com o verde aí das vossas ilhas. É mais o verde. E umas certas pessoas:)

    Um beijo grande!

    Mar

    PS: A minha aluna das Flores está muito feliz e é uma miúda para lá de especial e de forte. Hei-de contar-te, quando voltarmos a falar:)

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    1. Este sítio é obrigatório em Ponta Delgada. Mesmo lindo! Daqueles que nascem de paixões. O verde não anda muito longe. Sais de Ponta Delgada e lá está ele :) Afinal, aqui tudo é perto ;) Quanto às "certas pessoas", estarão aqui, de braços abertos :)
      Estou curiosa em relação à tua aluna das Flores. Pergunta-lhe o nome do professor de Português do ano passado. Conheço dois muito bons nas Flores. Um deles, muito meu amigo :)

      Um beijo grande,

      Ilídia

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