quarta-feira, 6 de junho de 2012

Uma refeição simples (quase) no final de um ciclo

Acho que hoje bati um recorde. Cinco minutos para almoçar. Uma sandes, comida à pressa, de pé, no bar da escola. Ao dar a última dentada, reparei que os alunos já estavam à minha espera, à porta da sala de professores. Uma aula extraordinária para apresentarem os últimos trabalhos do ano. A última vez em que estivemos todos juntos, naquele contexto. Na próxima semana, encontrar-nos-emos. Haverá sessões de apoio para os exames. Mas aula, foi hoje a última. A última de três anos. 
Enquanto os ouvia falar sobre Memorial do Convento, recuei no tempo. Vi-os, com quinze anos. Alguns deles, nem isso. Uns adolescentes inseguros, com medo de falar. Hoje, vi uns jovens eloquentes, preparados para o futuro. E senti-me orgulhosa. Orgulhosa do percurso que fizeram. E que eu tive o privilégio de acompanhar. E, apesar do cansaço, a sensação é a de que, apesar de tudo, esta ainda é uma das profissões mais bonitas. Por mais cansativa que seja. Por mais desacreditada que esteja. Por mais burocracia que tenha. Por mais que pareçam ser os números o que mais interessa. Rankings. Estatísticas. O mais importante são as pessoas. O João, a Leonor, a Beatriz, a Joana, a Catarina, o André, o Diogo, o Paulo, a Margarida, a Ana... Olhar para um grupo de jovens e pensar que em cada um deles está um bocadinho de nós é algo de que qualquer professor se deve orgulhar. Eu orgulho-me. E, por mais anos que passem, não consigo deixar de sofrer sempre que acabo um ciclo com pessoas com as quais convivi diariamente ao longo de três anos. Vou ter saudades deles. 

Depois deste dia, cheguei a casa sem grande inspiração para cozinhar. Uma refeição simples. Aquilo que no resto do país são pataniscas e, nos Açores, tortas. Com um copo de vinho ao lado. E a música dos October Flight, uma nova banda da minha terra que ando a ouvir em repeat. Porque na minha terra se faz boa música :)


Agora, a receita das tortas:
(para três)
200 g de bacalhau cozido, desfiado
4 ovos
1 raminho de salsa, picada
1 cebola média, picada
3 colheres de farinha
sal e pimenta
açaflor (1 colher de café)
noz moscada

Misturei os ingredientes todos. Temperei com sal, pimenta e o açaflor. Aqueci uma frigideira anti-aderente, untada com azeite. Deitei colheradas da mistura e deixei cozinhar. Tradicionalmente, as tortas são fritas em óleo abundante. Optei por esta forma, por ser mais saudável, mas caso optem por as fritar, não se esqueçam de usar muito papel absorvente, para ensopar o óleo.

5 comentários:

  1. Não podia estar mais de acordo. Ensinar é um privilégio. Desde os mais pequeninos aos mais graúdos. Passar a cada um deles uma fracção de conhecimentos que, por insignificates que pareçam, podem ser decisivos em algum momento das suas vidas. Ensiná-los a crescer também, a descobrirem-se, inventarem-se, ultrapassarem-se. Dou graças a todos os professores que entravam na sala de aula como quem vai á descoberta, pronto a dar o melhor de si e a descobrir o melhor de cada aluno. A todos os professores que me incentivaram a ser mais e melhor, que foram exigentes e me ensinaram a ser exigente comigo. Os pais e os professores são os companheiros mais importantes na fase de maior aprendizagem e crescimento. O exemplo que nos transmitem marcam-nos para sempre. Parabéns, Ilidia, por teres escolhido essa linda profissão e por não desistires, não obstante o descrédito, a banalização.
    Beijinhos

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  2. Creio que disseste bem o entendimento mais elementar da nossa profissão. Carinho por essa enumeração. Os nomes dos teus alunos. Como no Memorial do Convento. Os nomes dos homens que trabalharam naquele lugar. "Aí ficam os nomes".
    E não sabia que nos Açores, as pataniscas eram tortas. Aprendi mais uma coisa, eu. Não foram só os teus alunos, vês?

    Um bom fim-de-semana. Descansa, no fim de mais um ciclo.

    Mar

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  3. Passei por aqui para me emocionar!
    Há nos nossos alunos um bocadinho de nós! Há em nós muitos bocadinhos de todos os nossos alunos!
    Um abraço
    Emília

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  4. Mais um fim de ciclo, como diz a Mar. E é isso mesmo. Apesar de sabermos que muitos outros ciclos virão, existem sempre alunos que nos marcam pelo seu esforço, pela sua criatividade, pela sua espontaneidade, pela sua inteligência, pelos seus hábitos... E reconheço aí alguns nomes, mesmo sem os apelidos, por já terem sido "meus" também. Sei o que queres dizer, apesar de por vezes me sentir como os médicos com alguma experiência que veem no paciente simplesmente mais um porque sabem que todos os dias terão outros. Essa massificação humana assusta-me.Pensar por vezes dessa forma também. Não tentar ver a individualidade de cada aluno não faz parte da minha maneira de ser, mas às vezes acaba por ser uma defesa perante alguns alunos desinteressantes.
    Quanto às tortas, não ficaram nada tortas mas sim lindas e redondinhas.

    Um bom fim-de-semana para os três.
    Patrícia

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  5. Obrigada a todas pelas vossas palavras. Esta semana foi particularmente difícil. Muito trabalhosa, com notas para decidir (o que me custa sempre muito), despedidas. E a morte da minha professora. Daquela que, de entre todos os que tive, elejo como a minha professora. A minha professora de Português do Secundário, a quem devo muito do que sou hoje. Daquelas que deixam marcas. Reformou-se há pouco tempo e morreu esta semana. Uma grande injustiça, que me deixou revoltada. E a pensar mais ainda que esta vida é mesmo para ser aproveitada. Um dia, acaba tudo. E pode ser tão cedo. Tão injustamente cedo.

    Emília, obrigada pela visita. Gostei muito de te ver por aqui. E as tuas palavras também me emocionaram.

    Beijos para todas e boa semana.
    Ilídia

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O Acre e Doce é um blogue que celebra a vida de casa, principalmente os momentos passados à volta da mesa. É um blogue de coisas que nos fazem felizes, sejam uma refeição, um filme, um livro ou um ramo de flores frescas.